
Uma corrente oceânica que vai do Atlântico Sul até o Ártico começa a perder força. Cientistas alertam o governo americano, mas não são ouvidos. Isso só acontece quando ela finalmente para de circular, desencadeando uma série de fenômenos climáticos extremos: furacões varrem os EUA, um tsunâmi inunda Nova York e uma nova era glacial torna o país inabitável, com a população tendo de fugir para o México. Eis o enredo do filme O Dia Depois de Amanhã, um blockbuster de 2004 dirigido pelo alemão Roland Emmerich. Ele é um festival de exageros e coisas puramente ficcionais, bem ao estilo do chamado “cinema catástrofe” – Emmerich, um expoente do gênero, já havia dirigido Independence Day (1996) e Godzilla (1998).
Mas, ao contrário deles, O Dia tem algum fundamento científico. Tanto que o oceanógrafo Moacyr Araújo, professor e vice-reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), imediatamente se lembra do filme ao ser perguntado sobre a Corrente do Golfo. “Apesar de se tratar de uma obra de ficção, é bom lembrar que a AMOC está no seu ponto mais fraco em mais de um milênio”, diz. AMOC é a sigla em inglês para “Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico”, o nome técnico da Corrente do Golfo: um fluxo monstruoso, que tem 100 km de largura e desloca inacreditáveis 110 bilhões de litros de água por segundo – isso é 500 vezes a vazão do Rio Amazonas, ou mais do que todos os rios do planeta somados.
A corrente se forma no Golfo do México e sobe pelo litoral dos EUA levando água quente, para então atravessar o Atlântico e se dividir em duas: uma parte banha a Europa, enquanto a outra vai até a Groenlândia e o Oceano Ártico. Ela é um grande mecanismo de distribuição de calor, diretamente responsável pela regulação do clima na Terra – inclusive porque funciona conectada a outros fluxos oceânicos [veja gráfico abaixo]. Se a Corrente do Golfo deixasse de existir, o mar avançaria sobre a costa da América do Norte, e a Europa ficaria mais fria e sujeita a grandes tempestades. Mas não só isso: Índia, África e América do Sul receberiam menos chuva, comprometendo sua produção agrícola.
Ela nasce no México e atravessa o Oceano Atlântico carregando 110 bilhões de litros de água – mais do que todos os rios do mundo somados. Leva calor para a Europa e regula as chuvas na América do Sul. Mas novos estudos revelam que a corrente vem perdendo intensidade e alcançou o ponto mais fraco em 1.600 anos. Veja por que isso está ocorrendo – e o que pode acontecer se ela parar.
A Corrente do Golfo pede socorro
publicado originalmente em superinteressante